12 janeiro 2010

ATÉ LOGO

Diz-me até logo. Um logo sem tempo. Como quem diz «era uma vez». Abre-me reticências e empurra-me, que não tenho coragem de me lançar.
Fica por perto. Um perto curto ou longo. Sim, tu percebes, aí: esse perto. O suficiente para te sentir respirar no meu pescoço, mesmo quando estendo a mão e não te toco, porque os quilómetros não deixam. Ou mesmo aí, nesse ermo que posso ver, montanha escarpada rodeada de fosso de crocodilos e ponte levadiça, para onde te retiras sem avisar. Perto só na minha medida de sentir.
Até logo, sem certezas. Por antítese, sem dúvidas. Por definição, sem questões. Com ponteiros de relógios que se cruzam ao contrário, para baralhar o tempo. Sem medo de um adeus, sem campo para retalhar. Todo o espaço é mar, é céu, fluido e leve, solto e livre. Nada está preso, mas tudo tem o seu lugar….
Olho para as reticências em aberto. Tão mais fácil uma exclamação, um ponto final que fosse. Três pontinhos, três buraquinhos numa parede branca e interminável. Espreito pelo primeiro: tudo negro. Nada revela. O segundo devolve-me uma luz intensa, que encandeia. O terceiro guarda os seus segredos sob uma bruma densa, onde nem as sombras sobrevivem. Rapidamente me arrependo da curiosidade: nada revela daquilo que ainda não se construiu.
Três pontinhos… três hipóteses, melhor que bifurcação. Faz-me à vida de empurrão. Queria ficar aqui, no colo doce do conforto, na segurança do que já foi. Mas… por ter sido, está vazio, oco de oportunidade. Fecho os olhos, abro os braços, sinto o vento, na resistência de um corpo sem direito a vontade, a caminho da gigantesca debulhadora da existência. Em torno de um eixo, no turbilhão, mais uma espiga de tantas outras, revelarei meus grãos, libertarei a palha, à força de encontrões e reviravoltas.
Até Logo: digo-te eu. Corto amarras que só eu vejo, liberto-te das correntes que não tilintam. Numa caixa, com laço de seda, faço-te a derradeira oferta. Não de mim, que já sou tua. Abre a caixa, são para ti: três magníficas reticências. E um beijo... Guardo só as lágrimas. Agora vai! Faz-te à vida!
Nesse dia, sem tempo, num campo lavrado e adubado, cairão duas sementes. Sem palha, sem estorvos. Nesse dia, mais que perto, apertados na terra fértil, partilharemos a água e daremos as mãos em busca da luz.
Assentaremos em solo firme o nosso «Era uma Vez».


Novembro 2009

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